sábado, 16 de agosto de 2008

II - Alimentação e Nutrição de Peixes Ornamentais - por Dr. Rodrigo Mabilia

Belos exemplares de carpas koi de um lago ornamental. No mercado existem linhas de rações destinadas para estas espécies. Muitas destas linhas de rações vem com a denominação "ponds" e devem sempre ter preferência na hora da escolha. Não somente por atender as exigências nutricionais, mas pelo baixo potencial de poluição que pode deteriorar a qualidade da água dos lagos de jardim.
Parte II - Estratégias Nutricionais para Manter os Peixes Saudáveis
Para manter peixes saudáveis é preciso compreender três aspectos básicos relacionados à alimentação: qualidade, quantidade e freqüência. Esta tríade compõe o que denominamos de estratégia nutricional. Um aquarista consciente sempre buscará infromações e o melhor alimento para seus peixes. Uma alimentação saudável previne o surgimento de inúmeras enfermidades dos peixes. Sob o aspecto de comportamento há um incremento de vitalidade, acentuação da coloração e melhoria da atividade reprodutiva dos peixes. Não esqueça que uma boa ração deve conter os seguintes pré-requisitos:
- alimento completo para a espécie e fase de vida da mesma.
- conter somente ingredientes de boa qualidade.
- rico complexo vitamínico com complexo B, vitamina E, além de quantidades elevadas de vitamina C próximas a 500mg.
- rico complexo mineral. Por exemplo, sempre conter maior quantidade em relação a quantidade de fósforo, sendo este último em pequenas quantidades.
- não deve alterar a coloração da água.
- não conter excesso de gordura (Extrato etéreo), principalmente em formulações para peixes adultos. Rações que oferecem níveis acima de 8% de extrato etéreo podem ter a intenção de mascarar a falta de palatabilidade e sofrer com maiores riscos de peroxidação desta matéria prima. Mais grave ainda é o fato de que o excesso de gordura restringe o consumo alimentar e pode dificultar a assimilação de alguns nutrientes da ração.
- conter níveis de proteína bruta entre 30 a 35% (kinguios e carpas koi, por exemplo) e níveis superiores para peixes carnívoros e onívoros com tendência a carnívoros. Para acarás discos, por exemplo, estes níveis de proteína bruta ultrapassam 46%.

Casal de Acarás Discos exibindo vitalidade. Os Discos são muito exigentes quanto a alimentação e podem adoecer facilmente se houver algum desbalanço de nutrientes.
Na foto é possível visualizar alevinos de carpas coloridas com o ventre moderadamente retraído. Na compra de peixes, quando visualizarmos um peixe nestas condições devemos suspeitar de algum problema.
A dica é sempre solicitarmos que alguém alimente os peixe que queremos comprar na loja para observarmos se há, ou não apetite. Peixes enfermos geralmente perdem o apetite, ok?
- A qualidade do alimento
a) Deve-se a presença dos ingredientes que contenham os nutrientes necessários para que o peixe realize suas atividades basais (respiração, nado, etc...), crescimento e reprodução dos peixes. Os ingredientes de uma ração correspondem, por exemplo, ao óleo de soja, de milho, de peixe, os farelos e farinhas de peixe, de arroz, glúten, etc... Os nutrientes estão inseridos nestes ingredientes. Assim, a escolha dos melhores ingredientes está baseada na quantidade e necessidade dos nutrientes que a ração necessita para atender as exigências nutricionais de um peixe. Ingredientes de qualidade inferior geralmente são encontrados em rações mais baratas. Rações mais caras, provavelmente devem conter ingredientes de qualidade superior. O alto custo de algumas marcas de rações podem ser compensados pelos benefícios. É verdade que nem tudo que é mais caro necessariamente é melhor, mas com certeza merece uma atenção especial. O que for barato demais devemos suspeitar, pois muitas fezes são utilizadas matérias primas de qualidade inferior e técnicas de fabricação com o emprego de tecnologias menos eficazes no processo de fabricação. O aquarista precisa ser muito crítico sobre este aspecto e atento para estratégias de marketing enganosas executadas por quem não entende de aquarismo. Diferentes espécies e fases de vida implicam em diferentes exigências nutricionais. Estas exigências estão relacionadas aos hábitos alimentares. Vale lembrar que hábitos alimentares dos peixes ornamentais classificam-se basicamente em carnívoros, onívoros e herbívoros. O aquarista, sempre que precisa, deve procurar informar-se sobre quais as melhores alternativas de alimentação para as espécies de peixes que cultiva.
b) A combinação adequada de nutrientes como aminoácidos, vitaminas e minerais. A combinação destes nutrientes é fundamental. Um bom exemplo é a relação entre os minerais cálcio e fósforo. Na formulação das rações há uma proporção padronizada de 1,5:1 aproximadamente. Outro exemplo seria o uso da vitamina E que além de um nutriente serve como antioxidante para preservar a gordura das rações (Extrato Etéreo). Uma deficiência de aminoácidos essenciais e vitamínas pode inclusive ocasionar algumas patologias de causa nutricional.
c) Estabilidade na água. A ração deve causar o menos possível de lixiviação. A lixiviação é a perda de nutrientes da ração em contato com a água. É o quanto a ração polui a água do aquário. Um bom exemplo é o caso de rações que liberam excesso de fósforo e proteína na água. Rações de baixa digestibilidade também se enquadram neste contexto. A vitamina C, por exemplo é hidrossolúvel e necessita estar protegida no pellet. O aquarista deve deixar de lado na prateleira rações com baixos níveis de vitamina C. Significado de Lixiviação de nutrientes: é o termo técnico utilizado na hora de expressarmos a perda dos nutrientes em um pellet, ou floco de ração na água. Rações pouco estáveis e fabricadas com processos de baixa tecnologia permitem a lixiviação de nutrientes (desde proteína até vitaminas e minerais). Quando mais lixiviação mais poluição teremos no ambiente aquático. Poluição essa causada pela ração que coloca em risco o equilíbrio do ambiente aquático em que vivem nossos peixes. As conseqüências já sabemos: aumento dos níveis de amônia (lixiviação de proteína) e proliferação de algas (lixiviação de fósforo e do nitrogênio protéico).
Nessa imagem, podemos ver um pellet de ração de baixíssima qualidade perdendo nutrientes (lixiviação de nutrientes) e absorvendo uma grande quantidade de água.
Visualização da ração que vai ao fundo rapidamente após absorver água. Característica essa indesejável, quando pretendemos alimentar espécies que tem o hábito de se alimentar na superfície da água. é fato que uma grande quantidade dessa ração entra em decomposição e deprecia a qualidade da água dos lagos, tanques e aquários.
d)Capacidade em atrair os peixes.
A palatabilidade e a cor são os principais fatores para atrair os peixes. O aquarista precisa estar atento que os peixes possuem preferências e podem algumas vezes não demonstrar tanta voracidade em comer a ração logo após alguma mudança de marca. Isto não é uma regra, mas peixes condicionados a comer uma mesma ração por muito tempo podem inclusive rejeitar a nova ração.
A flutuabilidade da ração, por sua vez também colabora para atrair mais, ou menos um peixe. Algumas espécies como corydoras, botias preferem pellets que afundam rapidamente. Já os discos alimentam-se muito bem no meio da coluna de água e tornam-se muito desajeitados ao comer na superfície da água.
Converse com o lojista, e discutam as melhores opções para os peixes que você compra. O lojista deve estar preparado para responder estas questões.
e) Granulometria
A granulometria corresponde ao tamanho e a forma de apresentação do pellet da ração. Preconiza-se um tamanho de pellet próximo de 20% da abertura da boca do peixe. Pellets grandes demais para peixes pequenos são prejudiciais pela mesma razão que pellets pequenos são prejudiciais para peixes grandes. A razão é fundamentada na maior demanda de energia para que o peixe consiga fazer a apreensão e ingestão de uma quantidade suficiente de ração para atender suas exigências nutricionais. Um desajuste da granulometria reflete em redução da taxa de crescimento.
Na imagem podemos obsevar uma acentuada desuniformidade dos grânulos da ração para peixes de lagos de jardim. Os efeitos prejudiciais de uma granulometria inadequada são mais evidentes em fases de vida mais jovens como o caso de alevinos e juvenis.
Os peixes de menor porte terão dificuldades de ingerir pellets que tiverem desvios acima da granulometria estabelecida para a faixa etária. Nas pisciculturas ornamentais que registram seus custos de produção e monitoram os desempenhos dos lotes é possível comprovar na prática os efeitos desastrosos do uso de granulometrias inadequadas.
- Quantidade de Alimento Oferecida:
Para peixes ornamentais de aquários, em geral a maneira mais prática de determinar a quantidade de ração a ser oferecida é através do apetite dos peixes.
É possível oferecer ração a vontade desde que:
- seja rapidamente consumida;
- não ocorram sobras;
- não causem um grande aumento repentino da cavidade celomática dos peixes.
Na época de reprodução aconselha-se aumentar a oferta de alimento, bem como a freqüência de alimentação para que os peixes produzam gametas de melhor qualidade que resultará em embriões, larvas e alevinos mais resistentes.
Há também uma alternativa técnica que pode ser aplicada em pisciculturas ornamentais, lagos de kinguios e carpas koi. Baseia-se no cálculo da quantidade de ração diária em função do percentual de biomassa. Isso é interessante para quem quer aproveitar o melhor desempenho dos peixes durante a fase de crescimento, reduzir os custos com alimentação e estimar a duração de seu estoque de ração.
Procedimento: Capture uma amostra de peixes do lago, ou tanque de peixes ornamentais. Após faça a contagem dos exemplares capturados. Deve-se sempre calcular o somatório do peso dos peixes tendo como resultado a biomassa total de peixes. Por exemplo: Um lago que irá receber 8 kinguios onde o somatório do peso dos peixes (biomassa) foi de 2,620kg. Quanto oferecer de ração diária ? Resposta: Biomassa total do lago, ou tanque X percentual de biomassa (em ração). 2,620 X 0,03% (3% da biomassa de peixes em ração) = 78,6g de ração por dia.
Vou responder mais três questões que não foram expostas:
1- O que é percentual de biomassa ? É o percentual de ração que devemos oferecer em relação a biomassa total (somatório do peso de todos os peixes). Existe uma tabela de referência deste percentual para kinguios e carpas koi de acordo com a fase de vida e a temperatura da água. Isto porque os peixes possuem diferentes exigências nutricionais em cada fase de vida. Já a temperatura influencia diretamente no consumo de alimento. Temperaturas elevadas estimulam os peixes a comerem mais, por outro lado as mais baixas induzem os peixes a comerem menos. 2- Como saber que percentual de biomassa utilizar ? Basta seguir a tabela referente ao percentual de biomassa oferecido diariamente para carpas e kinguios de acordo com a fase de vida e a temperatura da água.
* Temperaturas e épocas do ano impróprias para criação de alevinos de kinguios e carpas.
3- Quantas vezes ao dia devo oferecer a ração calculada ?
O total de ração estimado no exemplo acima foi de 78,6g. Lembram ? Pois bem, esta quantidade deve ser fracionada para ser oferecida de duas a quatro vezes ao dia para peixes adultos, ou juvenis e seis a oito vezes para alevinos. Se decidir oferecer 02 vezes diárias será 39,3 g na parte da manhã e 39,3 g na parte da tarde.
- Freqüência de alimentação: Quando o criador, ou aquarista não optarem pelo programa nutricional que envolve o percentual de biomassa para estimar a quantidade de ração deve-se oferecer ração duas vezes ao dia. Se quiser oferecer mais vezes ao dia não há problemas. Não há uma regra geral desde que não seja oferecida em excesso. O pior erro do aquarista é oferecer ração em excesso, pois além de não fazer bem a saúde dos peixes contribui para prejudicar a qualidade da água.
Continuação: Parte Final

Rodrigo G. Mabilia - Médico Veterinário, Msc. pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
Breve Histórico:
2002/2006 - execução de Projetos e Assistência Técnica em Piscicultura Ornamental e Aquarismo pela DeltaSul Aquacultura ltda.;
2003/2006 - atuou no AQUAVET (Laboratório Integrado de Diagnóstico de Patologias de Animais Aquáticos da Universidade Federal do Rio Grande do Sul);
2005-2006 - integrante da Equipe da AQUARIUM Alimentos e Acessórios para Aquarismo; 2003/2007 - Consultor, Professor e Responsável Técnico da Estação de Aqüicultura da Universidade Luterana do Brasil (Ulbra-RS);
2006-2007 - Secretaria da Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul atuando na sanidade de Animais Aquáticos * Rodrigo Mabilia atualmente é Médico Veterinário, Fiscal Federal Agropecuário do Ministério da Agricultura atuando na Divisão de Pescado no Estado de Santa Catarina.




Um comentário:

fellipe alves pereira disse...

O que for barato demais devemos suspeitar, pois muitas fezes* são utilizadas matérias primas de qualidade inferior e técnicas de fabricação com o emprego de tecnologias menos eficazes no processo de fabricação.

Fellipe Alves Pereira