sábado, 16 de agosto de 2008

A doença do Neon : Pleistophora - por Dr. Rodrigo Mabilia

Pleistophora: a doença do Neon Por Rodrigo G. Mabilia

1.0 Introdução – Considerações gerais sobre a Doença do Neon
A doença do Neon tem uma grande repercussão sob o ponto de vista sanitário em peixes ornamentais devido a sua alta patogenicidade (capacidade e severidade dos danos causados ao organismo).
A alta taxa de mortalidade e frustradas tentativas de tratamentos são duas características muito marcantes dessa enfermidade no meio aquarístico.
Outro aspecto muito importante é o desconhecimento de alguns aquaristas e criadores sobre a real causa dessa enfermidade e, por essa razão, não associam os sinais clínicos com o correto agente causador do problema.
Agente Causador: o agente causador da Doença do Neon é um protozoário interno da ordem Microsporida. O Pleistophora, é um parasita obrigatório intracelular, ou seja, é encontrado dentro do organismo (tecidos) do peixe. Essa é uma diferença muito marcante desse protozoário em relação aos demais, comumente estudados. Enquanto o Pleistophora é um parasita interno, a grande maioria dos protozoários parasitas de peixes são externos (Ictio, Oodinium, Chilodonella, Trichodina, entre outros).
O Pleistophora só acomete o Neon ? Não. O gênero Pleistophora acomete uma diversidade de espécies de caracídeos: Neons (Paracheirodon sp.), Rodóstomos (Hemigrammus rhodostomus), Rosáceos e uma série de outras espécies com menor freqüência. Há casos dessa doença também em paulistinhas (Danio rerio) demonstrando que não é uma doença exclusiva dos neons, embora, seja popularmente conhecida como tal. Esta nomenclatura se repete no exterior onde é denominada de Neon Tetra Disease (NTD), sendo essa a forma de encontrar muitas informações em sites de busca.
2.0 Considerações sobre o Ciclo de Vida e a Transmissão O Pleistophora, assim como muitos outros protozoários microsporídeos (Guglea e Ichthyosporidium), são capazes de formar cistos em diversos órgãos do peixe. O início do ciclo de vida ocorre quando os peixes ingerem os esporos presentes no ambiente. No trato intestinal, os esporos liberam formas embrionárias do parasita que ultrapassam o epitélio intestinal e via sanguínea atingem diversos órgãos, incluso a musculatura onde há formação de cistos. Os tecidos atingidos passam por uma severa reação inflamatória seguida de necrose e liquefação (uma verdadeira morte do tecido). A doença tem caráter agudo e em poucas horas (12 a 18 horas) já verifica-se os primeiros peixes moribundos. É possível a perda de um cardume em menos de 48 horas.
Transmissão: a transmissão desse microsporídeo é direta por via oral. A ingestão de esporos pelo peixe determina a continuidade do ciclo. Peixes mortos são uma importante fonte de infecção, pois liberam os esporos no ambiente, ou ainda podem ser devorados por outros peixes.
Sinais Clínicos: os sinais clínicos são marcados pela presença das lesões causadas por múltiplos cistos na musculatura. Os cistos causam colapso das fibras musculares e uma intensa reação inflamatória ao seu redor.
Neons acometidos de NTD - Neon tetra disease, ou simplesmente, Doença do Neon. Fonte: http://www.erdingtonaquatics.com
Neon acometido por NTD. Fonte: http://www.adventureangling.com
Forma com que os cistos de microsporídeos são observados durante a histopatologia. Visualização miscroscópica de um cisto em tecido muscular. Fonte: http://www.afsc.noaa.gov
Rodóstomo infestado por Pleistophora já com a marcação pálida-esbranquiçada na região do pedúnculo caudal. Fonte: Rodrigo G. Mabilia
Iinicialmente os peixes ficam hiperativos, com os movimentos operculares de respiração muito acelerados mesmo durante o apagar das luzes. Após algumas horas, já é possível perceber perda da coloração (porções esbranquiçadas que contrastam com a região do corpo não afetada). Muitas vezes essa região é bem demarcada e permanece pálida-esbranquiçada no pedúnculo caudal. Essa alteração de coloração precede a dificuldade de nado. O nado dos peixes fica prejudicado progressivamente até que o peixe perde o controle, entrando na fase agônica. O curvamento da coluna vertebral ocorre em alguns casos. A presença de infecções secundárias na pele, nadadeiras e vesícula gasosa (bexiga natatória) ocorre com grande freqüência, no entanto não resta muito tempo para sua constatação, nem evolução, pois os peixes não resistem por período suficiente.


Visualização dos esporos livres de Pleistophora. Forma com que o peixe ingere e se infecta. Fonte: http://o-fish.com

3.0 Fatores predisponentes para ocorrência do Pleistophora

Estresse pós-transporte: O estresse pós-transporte é, sem dúvida, o fator de maior predisposição para manifestação clínica do Pleistophora. O parasita encontra-se sob a forma de cistos (encapsulados e protegidos) no tecido muscular e/ou órgãos, mas a sua liberação para o meio externo de seus esporos ocorre mediante a morte do hospedeiro na maioria das vezes. Esse parece ser um ponto crucial, pois caso ocorra a morte de um, ou mais peixes portadores desses esporos durante o transporte (situação muito comum visto as condições adversas a que são expostos) haverá a disseminação desse protozoário microsporídeo para a água. O fato dos peixes sobreviventes enfrentarem um estresse agudo torna-os mais susceptíveis a uma infestação (ou até mesmo uma reinfestação). Sem defesas imunes competentes, os peixes adoecem abruptamente e manifestam os sinais clínicos já descritos após ingestão dos esporos (via oral) presentes no ambiente aquático. Esses sinais ocorrem durante o transporte, ou logo depois de chegar a sua origem.

Altas temperaturas e mudança brusca de pH: A associação de altas temperaturas com variações do pH (alcalinização) são também fatores que podem desencadear a manifestação clínica do Pleistophora. Neons e outros caracídeos adaptados naturalmente a pH ácido, quando submetidos a uma mudança brusca de pH (até uma faixa básica) podem ter a liberação de esporos a partir dos cistos superficiais na musculatura, ou cistos no tecido das brânquias. Mais uma vez, temos a condição para a continuidade do ciclo de vida do parasita e manifestação clínica da doença. O estresse pela exposição a uma faixa de pH inadequada para essas espécies é predisponente para que após a ingestão dos esporos do Pleistophora ocorra a doença aguda.

4.0 Prevenção As recomendações básicas de alimentação e manutenção da qualidade da água são de igual importância, assim como, devemos fazer para prevenir qualquer enfermidade em nossos aquários e/ou criação. O Aquarista deve evitar adquirir peixes recém chegados na loja, principalmente os considerados do grupo de risco para o Pleistophora (Neons, Rodóstomos, Rosáceos e Tetras). A quarentena nessas espécies é crucial para evitar a introdução de peixes infectados e peixes imunodeprimidos sob efeito do estresse agudo. É fundamental também cuidar para que não ocorram mudanças de pH (de ácido para básico), principalmente para neons e rodostomos já sob efeito do estresse do transporte. Essa mudança de pH, pode proporcionar reinfestações.

5.0 Tratamento Alguns criadores e aquaristas afirmar ter “segredos” para a cura dessa doença, mas a grande verdade é que não há tratamento específico. Qualquer tratamento executado, até o momento, é sintomático, mas nem por isso, desprezíveis. Entre os princípios ativos mais associados e indicados temos os nitrofuranos e a eritromicina. A utilização do SERA Baktopur Direct logo no início dos primeiros sinais clínicos pode garantir uma diminuição da taxa de mortalidade, favorecendo os indivíduos mais resistentes. Formulações a base de azul de metileno, permanganato de potássio, formalina, acriflavina não são eficazes.

Artigo gentilmente cedido ao Aquablog pelo amigo Dr. Rodrigo Mabilia, uma das maiores autoridades em alimentação, nutrição e patologia de peixes ornamentais do Brasil.

Alimentação e Nutrição de Peixes Ornamentais Por Rodrigo G. Mabilia - Médico Veterinário, Msc. pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

Breve Histórico: 2002/2006 - execução de Projetos e Assistência Técnica em Piscicultura Ornamental e Aquarismo pela DeltaSul Aquacultura ltda.; 2003/2006 - atuou no AQUAVET (Laboratório Integrado de Diagnóstico de Patologias de Animais Aquáticos da Universidade Federal do Rio Grande do Sul); 2005-2006 - integrante da Equipe da AQUARIUM Alimentos e Acessórios para Aquarismo; 2003/2007 - Consultor, Professor e Responsável Técnico da Estação de Aqüicultura da Universidade Luterana do Brasil (Ulbra-RS); 2006-2007 - Secretaria da Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul atuando na sanidade de Animais Aquáticos * Rodrigo Mabilia atualmente é Médico Veterinário, Fiscal Federal Agropecuário do Ministério da Agricultura atuando na Divisão de Pescado no Estado de Santa Catarina.

Um comentário:

nando disse...

depois de quanto tempo pode por peixe novamente no aquário?